O Senado aprovou o novo marco legal do saneamento básico (PL 4.162/2019). O projeto é de iniciativa do governo, foi aprovado em dezembro do ano passado na Câmara dos Deputados e agora segue para a sanção presidencial. A matéria baseia-se na Medida Provisória (MP) 868/2018, que perdeu a validade sem ter sua apreciação completada no Congresso Nacional em 2019. Assim, o governo enviou ao Legislativo um projeto com o mesmo tema.
O texto prorroga o prazo para o fim dos lixões, facilita a privatização de estatais do setor e extingue o modelo atual de contrato entre municípios e empresas estaduais de água e esgoto. Pelas regras em vigor, as companhias precisam obedecer a critérios de prestação e tarifação, mas podem atuar sem concorrência. O novo marco transforma os contratos em vigor em concessões com a empresa privada que vier a assumir a estatal. O texto também torna obrigatória a abertura de licitação, envolvendo empresas públicas e privadas (Agência Senado).
Sindicatos criticam lei e temem por população mais pobre
O PL 4162/2019 afeta a titularidade dos municípios, privilegiando as empresas privadas, e ainda cria um fundo público para fomentar a privatização. Um dos pontos mais graves é o fim dos Contratos de Programa, que desestrutura as companhias estaduais de água e esgoto ao acabar com os subsídios cruzados.
De acordo com o engenheiro e presidente da Fisenge (Federação Interestadual de Sindicatos de Engenheiros), Clovis Nascimento o PL é uma temeridade à universalização dos serviços de água e esgoto. “No Brasil de hoje, temos cerca de 33 milhões de brasileiros e brasileiras que não têm acesso à rede de água potável. Essas pessoas vivem nos bolsões de pobreza, nas favelas, nas áreas periurbanas e na zona rural. Essas áreas são deficitárias do ponto de vista econômico-financeiro e, sendo assim, a iniciativa privada não vai colocar recursos para atender a essa população. Porque a iniciativa privada só visa o lucro. Se essas áreas não são rentáveis, eles não vão viabilizar recursos. Agora, imaginem esse cenário em uma crise sanitária global do Coronavírus em que a água é um dos fatores de contenção de transmissão. Os mais pobres, mais uma vez, serão os mais prejudicados”, alertou Clovis.
Em nota, os sindicatos de engenheiros disseram que essa discussão não poderia ocorrer sem a realização de audiências públicas e debate com a sociedade. “Nesse cenário desolador vimos solicitar o sobrestamento da votação do PL 4162. Não podemos pautar a privatização de um bem essencial à vida como a água, que tem atuação direta no combate a esse vírus na higienização das mãos” (Fisenge).
Paris, Berlim e 265 estão revertendo privatização da água
Ao contrário do Brasil, diversas cidades pelo mundo estão revertendo as privatizações. Segundo reportagem da BBC, um mapeamento feito por onze organizações majoritariamente europeias, da virada do milênio para cá foram registrados 267 casos de “remunicipalização”, ou reestatização, de sistemas de água e esgoto. No ano 2000, de acordo com o estudo, só se conheciam três casos (FNU).
Sanepar prorroga isenção de tarifa social por mais 90 dias
Um dos aspectos mais importantes no argumento contra a privatização da água é o caráter social das empresas públicas. No mesmo dia em que o Senado aprovou a possibilidade de privatização do sistema e fim dos acordos entre municípios e estados (24), a Sanepar divulgou “Fato Relevante” ampliando por mais 90 dias a suspensão da cobrança.
“Em continuidade ao enfrentamento da pandemia, fica prorrogada a cobrança de contas de água e esgoto, para os clientes cadastrados na Tarifa Social, pelo período de 90 dias”, comunica.
Em 23 de março, Abel Demetrio, Diretor Financeiro e de Relações com Investidores, já havia anunciado ao mercado financeiro a suspensão. Com isso, o Paraná completará 180 dias de suspensão. De acordo com a Sanepar, em dezembro de 2019, 184 mil famílias estavam cadastradas na categoria Tarifa Social cujo valor da tarifa é de R$ 15,56 ao mês (Senge-PR).