Por Tércio Ribas Torres/Agência Senado
A alteração das regras das aposentadorias especiais é um dos pontos mais polêmicos da proposta de reforma da Previdência (PEC 6/2019) encaminhada pelo governo Bolsonaro ao Congresso Nacional e que está em análise na Câmara dos Deputados. As mudanças atingem categorias como a dos professores, a dos policiais civis e federais e a dos agentes penitenciários.
Para o presidente da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) do Senado, Paulo Paim (PT-RS), o nome “especial” para esse tipo de aposentadoria se justifica. O senador diz que as pessoas que trabalham em áreas consideradas insalubres, perigosas, penosas ou de alto risco terminam por prejudicar a saúde e a própria vida. Daí a justiça da aposentadoria especial.
Paim destacou que a CDH tem promovido uma série de audiências públicas para debater o assunto. Segundo o senador, os convidados têm demostrado “que é um absurdo não ter direito à aposentadoria especial, porque está comprovado que o número de anos de vidas desses profissionais diminui pelo fato de eles estarem expostos a agentes que prejudicam a vida”.
— Quando essa proposta elimina as [aposentadorias] especiais, é um absurdo. Porque esses profissionais vão morrer antes e, consequentemente, vão pagar a vida toda e vão acabar não tendo direito ao benefício — ponderou Paim.
O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) afirma que aumentar o tempo de contribuição e o tempo de serviço de categorias como professores e profissionais da segurança chega a ser um “requinte de crueldade”. Na visão da senadora Kátia Abreu (PDT-TO), reformar a Previdência é essencial para as contas públicas. Ela ressaltou que “temos que fazer isso com urgência, porém o caminho é combater os privilégios e fazer justiça”. Para a senadora, não é correto colocar o peso nos ombros das classes sociais mais frágeis.
— Tenho repetido que não votarei a reforma se for prejudicial a trabalhador rural, professor, policiais, idosos e mulheres — declarou.
Para o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), a reforma da Previdência é essencial para a economia, pois “sem a reforma, o Brasil quebra”. Ele disse que a proposta do governo tem um viés social, que vai permitir a “quem ganha menos pagar menos”. O senador admitiu que algumas regras serão ajustadas durante a tramitação da matéria no Congresso, mas reafirmou a importância fiscal da reforma.
— A reforma é uma sinalização de que as contas públicas vão entrar em equilíbrio e, com esse passo, o Brasil vai retomar o seu desenvolvimento, pois só assim é que vamos gerar emprego, que é o que o país precisa e quer — afirmou Fernando Bezerra.
Felipe Scudeler Salto, diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão do Senado que analisa dos dados macroeconômicos, aponta que a reforma da Previdência é importante para combater o deficit fiscal. O deficit previdenciário é, ressalta, o que mais pesa no valor negativo das contas públicas. Ele lembra que a população vem envelhecendo, o que é positivo. Mas, sem uma reforma, o Orçamento não suportará atender a Previdência e ainda investir em áreas como segurança, educação e saúde. Daí a importância do tema.
Professores
Hoje não há idade mínima para os professores conseguirem sua aposentadoria. O tempo de contribuição é de 30 anos para homens e 25 anos para mulheres, desde que tenham exercido exclusivamente funções de magistério. A proposta prevê idade mínima de 60 anos e tempo de contribuição de 30 anos para ambos os sexos.
Para professores da rede pública, segundo a nova proposta, a contribuição e a idade mínima são as mesmas que as da rede privada. No entanto, adiciona-se a necessidade de 10 anos de serviço público e cinco anos de tempo de cargo — como já é atualmente. Hoje, os homens precisam de 55 anos de idade mínima e 30 de contribuição, enquanto as mulheres precisam ter pelo menos 50 anos de idade e 25 de contribuição. Tanto para os professores da rede pública como da rede privada, haverá regra de transição.
A senadora Leila Barros (PSB-DF) diz considerar que as mulheres professoras do setor público serão o segmento profissional que sofrerá maior impacto na reforma, pois elas poderão ter que trabalhar por até 10 anos a mais antes de obter o benefício. Segundo a senadora, professoras que hoje podem se aposentar aos 50 anos passarão a ter este direito apenas com 60 anos de idade.
Policiais e agentes
Pelas regras atuais de Previdência, os policiais civis e federais precisam ter contribuído 25 anos, se mulheres, ou 30 anos, se homens, sendo o tempo mínimo de exercício do cargo de natureza estritamente policial de 15 e 20 anos, respectivamente. Não há idade mínima para a aposentadoria.
Pelas regras da reforma, tanto os policiais civis e federais como os agentes penitenciários e socioeducativos se aposentarão aos 55 anos. A idade valerá tanto para homens como para mulheres. Os tempos de contribuição, porém, não mudam e seguem diferenciados para homens e mulheres. Os agentes e policiais masculinos precisarão ter 30 anos de contribuição, contra 25 anos para as mulheres.
A proposta também estabelece um tempo mínimo de serviço específico de polícia de 20 anos para policiais e agentes homens e de 15 anos para mulheres. Progressivamente, o tempo de exercício chegará a 25 anos para homens e 20 anos para mulheres, para agentes e policiais.
Mortalidade
Em audiência pública na CDH, no último dia 22, o diretor jurídico da Federação Nacional dos Policiais Rodoviários Federais (FenaPRF), Marcelo Azevedo, defendeu a diferenciação da previdência dos policiais civis, porque a profissão é atividade de risco, gera desgaste físico e mental e restringe direitos. Azevedo lembrou que os policiais civis e federais não têm adicionais noturno, de insalubridade e de periculosidade, não ganham hora extra e não podem fazer greve.
No entanto, para o secretário-adjunto de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, Narlon Gutierre Nogueira, a mortalidade de policiais federais e rodoviários federais não se dá em níveis superiores em relação aos demais servidores. Nogueira destacou que outras categorias de servidores públicos têm natureza de risco e restrição de direitos, tanto quanto policiais civis.
Assessor da Secretaria de Previdência do Ministério da Economia, Alessandro Roosevelt Silva Ribeiro afirmouque a proposta do governo não extingue, mas diferencia os conceitos de aposentadoria especial no tocante a riscos físicos, químicos ou biológicos que possam prejudicar a saúde do trabalhador. De acordo com Ribeiro, não é a atividade que caracteriza aposentadoria especial, mas os perigos da exposição aos agentes nocivos dessa função.
Economia
O ministro da Economia, Paulo Guedes, tem afirmado que a intenção do governo é economizar cerca de R$ 1,2 trilhão em dez anos com reforma da Previdência. Só com a categoria dos professores, a economia projetada é de R$ 12 bilhões entre 2020 e 2030. No ano passado, o deficit da Previdência, aponta o governo, atingiu mais de R$ 265 bilhões. A expectativa do governo é que reforma permita o investimento de mais recursos em outras áreas, sinalizando ao mercado que as contas serão ajustadas, atraindo mais investimentos para o país e gerando mais empregos.
A oposição, no entanto, argumenta que o governo tem usado cálculos com previsão de baixa taxa de crescimento do PIB, com novas regras que prejudicam os mais pobres, em benefício dos interesses do mercado. A decisão do governo de colocar sigilo nos documentos que embasam os estudos da reforma também tem sido motivo de crítica até de aliados.
Oposição
Randolfe Rodrigues afirma entender que é necessário fazer algum tipo de reforma da Previdência. Ele aponta, porém, que a proposta do governo não é a ideal, pois “70% dela retira dos mais pobres e 30% dos privilegiados”. O senador também diz que as desonerações previdenciárias, que poderiam somar cerca de R$ 400 bilhões, deveriam ser repensadas. Randolfe aponta que a tributação de juros e dividendos e o aumento do imposto sobre a herança poderiam ajudar no equilíbrio das contas públicas.
— A oposição compreende que tem um gasto fiscal, mas essa conta não pode ser paga pelos mais pobres. Reforma para tirar direitos dos pobres que pouco têm, que amplia a economia informal, que pode aumentar o número de indigentes, essa não. Nós da oposição resistiremos — concluiu.