O Projeto de Lei 416/2020, em análise na Assembleia Legislativa, acendeu a luz amarela sobre a possibilidade de fatiamento da Sanepar. Na mensagem enviada ao Legislativo, o governador Ratinho Junior (PSD) diz que a medida visa modernizar a empresa após a aprovação do novo marco regulatório do Saneamento. A medida abre caminho para que a Sanepar se associe a outras empresas para prestar serviço no Paraná, em outros estados e até fora do Brasil. Para entidades sindicais, o projeto não é transparente. Eles questionam a possibilidade de a Sanepar ser sócio minoritária e o modelo SPE (Sociedade de Propósito Específico) que diminuíram o controle social da empreitada, além de tornar a Sanepar uma empresa mais voltada para atender aos interesses do mercado do que saneamento para o povo.
O PL se encontra pronto para votação. Acordo de líderes prevê que as emendas sejam votadas na terça-feira e com votação em plenário nesta quarta-feira (15). Ele altera a Lei 4.684, de 24 de janeiro de 1963, autorizando a companhia Sanepar a ampliar a sua área de atuação, com a possibilidade de expansão dos seus negócios no Brasil e também no exterior tem que ser encarada com desconfiança. Na mensagem, o governador alega que “a busca pela universalização do saneamento no Paraná somente será possível se a empresa estatal estiver preparada para atuar em parceria com outras empresas. A ampliação dos limites territoriais da atuação da Sanepar está intimamente ligada à globalização da economia e das relações empresariais”.
Contudo, o projeto é visto com desconfiança por entidades sindicais. Em nota, elas pedem a retirada do regime de urgência e questiona a transparência da proposta. “Um gargalo dessa mensagem é justamente a adoção da SPE. O PL parece existir simplesmente para justificar e liberar a criação de subsidiárias, Sociedades de Propósito Específico ou qualquer outra espécie jurídica de associação que se organize. Ainda que a mensagem preveja que isso só poderá ser realizado mediante aprovação em Assembleia Geral de Acionistas. Não só isso, pode abrir espaço para PPPs (Parcerias Público Privadas) e outros modelos”, dizem os sindicatos.
As organizações ainda questionam como a companhia arcará com as despesas necessárias para possibilitar a participação em certames licitatórios e para conseguir vencê-los, pagamento de outorgas, realização de investimentos; se neste processo seriam utilizados recursos do caixa (receitas) da empresa para expansão para outros estados ou países; e a empresa faria captação de recursos, oferta de ações, debêntures, financiamentos, aporte de acionistas, se endividaria etc?”
Emendas fortalecem Sanepar
O deputado Tadeu Veneri (PT) também tem questionado ao PL. Ele vai apresentar três emendas. Para o líder do partido, “a empresa só é estratégica se ela atuar em benefício ao desenvolvimento do estado e da população, não voltada para gerar lucro aos acionistas privados. A mudança do modelo pode permitir que o povo paranaense perca o controle da Sanepar”, suspeita Tadeu Veneri. Atualmente, o Governo do Paraná só tem 20% das ações.
Em uma das emendas, é solicitada autorização da Assembleia Legislativa do Paraná, após análise dos impactos concretos e excepcionais, considerando a supremacia do interesse público, para poder participar, majoritária ou minoritariamente, de consórcios, e desde que atendido critérios de interesse público social. Outra emenda dá exclusividade a Sanepar, restando vedada concessão a sistemas privados, a captação, o tratamento e a distribuição de águas, quando constatado alto interesse público.
Por fim, a última emenda visa garantir que as regiões mais lucrativas subsidiem as mais carentes. A ideia é reduzir as desigualdades sociais. “A SANEPAR terá por diretriz geral de ação a conscientização da água enquanto bem de domínio público, recurso natural limitado e dotado de valor econômico, sob primazia do interesse público através do subsídio cruzado”, diz o texto.
A reportagem apurou que 156 municípios atendidos pela Sanepar não possuem rede de esgoto. Já 110 cidades podem ser passadas para setores privados via PPP caso o projeto seja aprovado. A preocupação é de que o estado fique com o ônus das regiões mais pobres e a parte boa com as empresas sócias.
“A questão é quem vai controlar a água que nós vamos receber? Vimos o processo no Chile em que um litro de água é mais cara do que uma Coca Cola. A gente não pode abrir mão do controle da distribuição. A SPE vai permitir que o estado seja minoritário”, questiona o deputado Arilson Chiorato, que também deve apresentar emendas.
Transparência e controle social
As SPE tem nível de controle muito baixo, seja do poder público, seja do mercado, avalia o presidente do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Paraná (Senge-PR), Leandro Grassmann. O engenheiro argumento que é um modelo que inibe o compliance e deixa uma porta dos fundos abertas e perde o controle dos gastos da empresa.
“Pode ser que o projeto tenha como objetivo modernizar a empresa. A questão é: nesse modelo, quem faz o controle disso, quem vai auditar, como garantir a transparência. O projeto não tem atendido isso”, indaga Leandro Grassmann, que complementa, “eu fico preocupado com um projeto que delega as decisões sobre o futuro da empresa em um sistema obscuro. Esse projeto pode dar um jeito para privatizar a empresa por outros meios”.