Medidas econômicas de Bolsonaro contra o coronavírus “infectam” os mais pobres

MP 927 permite suspensão do contrato de trabalho por até quatro meses e relaxa fiscalização

Foto: Isac Nóbrega/PR
Imprensa
23.MAR.2020

Por Manoel Ramires/Senge-PR

O presidente Jair Bolsonaro (Sem partido) tem reclamado dos governadores com relação às medidas de saúde no combate ao coronavírus. Para ele a”histeria diante de uma gripizinha” com fechamento de aeroportos, shopping e comércio em geral pode arruinar a economia. Bolsonaro, por outro lado, que se reuniu com empresários em vídeo conferência, publicou a Medida Provisória 927 que autoriza a suspensão de contratos de trabalhos por quatro meses. O presidente ainda autoriza o corte de salários dos trabalhadores. Todas as medidas beneficiam os empresários e “infectam” a renda dos trabalhadores.

MP 927/2020 foi publicada na madrugada de domingo. Ela abordas as medidas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública. A MP legaliza a concessão de férias coletivas, a antecipação de feriados, a utilização do banco de horas dos funcionários e o relaxamento na fiscalização de segurança e saúde no trabalho. A concessão de férias coletivas sequer precisa ser negociada com os trabalhadores, ficando a critério do empregador.

Uma das medidas mais duras adotadas pela #MPdaMorte e que deve impactar na qualificação dos trabalhadores é a possibilidade de interrupção por até quatro meses do contrato de trabalho. O artigo 18 estabelece que “contrato de trabalho poderá ser suspenso, pelo prazo de até quatro meses, para participação do empregado em curso ou programa de qualificação profissional não presencial oferecido pelo empregador. O empregador poderá conceder ao empregado ajuda compensatória mensal, sem natureza salarial, durante o período de suspensão contratual. Não haverá concessão de bolsa-qualificação no âmbito da suspensão de contrato de trabalho para qualificação do trabalhador”.

A MP é criticada pela oposição que tem defendido medidas de proteção dos trabalhadores. Para o ex-candidato à presidente, Guilherme Boulos, “enquanto outros países estão proibindo demissões e garantindo salários, ele libera a suspensão dos contratos sem pagamento. Os presidentes da Câmara e do Senado podem devolver a MP 927 ao governo, sem levar a plenário, por inconstitucionalidade e crime contra a economia popular (Lei 1.521/51)”.

Para o professor de direito do trabalho, Lawrence Mello, a MP ainda prevê a diminuição de 25% do salário, sem diminuição da jornada (art. 1º, § único). “A situação atual passa a ser considerada “hipótese de força maior”. Assim, aplica-se o art. 503 da CLT, segundo o qual é lícita a redução do salário em até 25%, sem redução da jornada de trabalho (ainda que remota)”, avalia. Em resumo, conclui o professor, esta MP poderia ser denominada “todo o poder às empresas”. “O Estado legitima a violência e prioriza o lucro, em detrimento da vida, em um nível até então desconhecido do ponto de vista da regulação do trabalho no país”, denuncia.

Essa não é a primeira medida econômica que ataca os trabalhadores. Com 41% dos trabalhadores na informalidade, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e o ministro da Economia, Paulo Guedes, querem destinar apenas R$ 200 como auxílio. O governo ainda propõe, via MP, a autorização para que empresas cortem metade do salário dos funcionários que forem mantidos em casa.

As medidas vão na contramão do que sugere o Ministério Público do Trabalho. Em nota técnica, o MPT sugere adoção de medidas que garantam emprego e renda dos trabalhadores de atividades e setores econômicos atingidos pelas políticas de saúde pública para enfrentamento da pandemia da COVID-19. Entre essas garantias estão “suspensão dos contratos de trabalho (lay off), com garantia de renda”.

Proteção ao trabalhador
A posição de Bolsonaro também diverge com medidas econômicas adotadas em outros países que enfrentam o coronavírus. No Reino Unido, o Estado se comprometeu a pagar até 80% dos salários dos empregados. O anúncio feito pelo primeiro ministro Boris Johnson aconteceu quando foi adotadas medidas de fechamento do comércio como são feitas no Brasil por governadores e prefeitos e criticada por Bolsonaro. O pagamento pode chegar até 2,5 mil libras (R$ 14,5 mil).

Para o DIEESE, em nota técnica “A pandemia do coronavírus e a anemia da economia brasileira”, o Governo Federal tem se aproveitado do momento para adotar medidas que só infectam os trabalhadores e imunizam os trabalhadores. “O governo tem insistido em subsídios tarifários e monetários para aumentar a renda disponível ao setor empresarial, mas o caso brasileiro caracteriza-se por insuficiência de demanda, ou seja, o governo deveria ampliar os gastos para manter a roda girando e não somente postergar o recebimento de recursos”, aponta.

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