“A agroecologia precisa estar no centro das definições sobre o futuro dos nossos municípios nos próximos quatro anos”, disse o engenheiro agrônomo e consultor da iniciativa “Políticas Públicas de Agroecologia na Boca do Povo” no Paraná, Claudio Luiz G. Marques. As eleições de 2024 são, na opinião dele, um momento oportuno para conscientizar a sociedade a respeito da importância de se promover e valorizar as iniciativas agroecológicas em todo o País. “Por causa das eleições, é neste ano que as pessoas em geral, fora aquelas que atuam organicamente na construção de políticas públicas no dia a dia, dedicam um pouco mais de atenção para pensar o município em que vivem, a rua onde moram, o espaço da cidade e a representação política dos interesses da sua comunidade”, acrescentou.
A avaliação de Claudio Marques é parte das definições extraídas da iniciativa “Políticas Públicas de Agroecologia na Boca do Povo”, promovida pela Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) e por entidades e redes agroecológicas de todas as regiões brasileiras ao longo do segundo semestre de 2023. No Paraná, as atividades contaram com a participação de agricultoras e agricultores agroecológicos, lideranças políticas, coletivos e organizações populares, comissões e conselhos gestores de políticas públicas e representações de consumidoras/es de alimentos orgânicos e agroecológicos que, entre outras questões, apontaram o tema como essencial à garantia de vida digna, à alimentação adequada e à sustentabilidade socioeconômica das regiões brasileiras.
“Há diversas iniciativas locais e um histórico de construção de planos e programas de governo, já iniciados no passado, que precisam ser retomados ou aprimorados para avançarmos no sentido de vermos a pauta da agroecologia ser abordada com o devido respeito e com o destaque que merece nessas eleições”, argumentou Marques.
No Paraná, existem 14 políticas públicas estaduais em vigor, relacionadas diretamente à promoção da agroecologia e, em pelo menos 4 municípios – Francisco Beltrão, Matinhos, Realeza e Rebouças – há leis aprovadas que tratam diretamente desse tema. São normativos legais e políticas públicas de incentivo e valorização da agroecologia e da produção orgânica, seja por meio da compra direta de produtos da agricultura familiar certificada, da qualificação da alimentação escolar, do crédito ou subsídio específico na área da assistência técnica e extensão rural, ou ainda na redução do uso de venenos agrícolas.
“Vivemos em um país com alto índice de contaminação ambiental e de contaminação da água potável, que entra pelas torneiras das residências já envenenada com agrotóxicos, segundo pesquisa do Ministério da Saúde, contida no Sisagua (Sistema de Informação da Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano – (2022), que identificou a presença de agrotóxicos na água tratada em quantidade acima do limite considerado seguro. O Brasil também tem incidência alarmante de doenças potencialmente causadas pela intoxicação com agrotóxicos, como o câncer e as deformações genéticas, segundo informações do Instituto Nacional do Câncer (INCA) e do próprio DATASUS, que registrou mais de 8.400 intoxicações por agrotóxicos no país em 2019 e um aumento de 109% nesses indicadores no período de uma década. Não se pode adiar mais a mobilização popular e de convencimento dos eleitores e eleitoras”, destacou o consultor da iniciativa da ANA no Paraná.
A expectativa ainda é de que, neste 2024, seja aprovada uma proposta de lei estadual na Assembleia Legislativa do Paraná (ALEP), que de fato contemple o diálogo, a construção e que esteja 100% em sintonia com o debate feito nas oficinas e seminário da iniciativa “Políticas Públicas de Agroecologia na Boca do Povo”, bem como nos fóruns e encontros promovidos pelas redes e articulações agroecológicas do estado.
Na Boca do Povo
Em outubro e novembro do ano passado, nos municípios de Palmeira (PR), Maringá (PR) e Curitiba (PR), ocorreram atividades da iniciativa para discussão, formulação e sistematização de propostas para o III Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Planapo) e para aprovação da lei estadual que institui a Política Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica (Peapo). “As redes agroecológicas no estado e a Articulação Paranaense de Agroecologia (APRA) vêm intensificando a proposição e qualificando cada vez mais o debate sobre o fortalecimento das políticas públicas de agroecologia, de apoio e de estímulo à produção nas propriedades rurais da agricultura familiar, nos assentamentos de reforma agrária e nas comunidades tradicionais, como os territórios indígenas, quilombolas e faxinalenses”, completou Claudio Marques.
A engenheira agrônoma da Associação de Estudos, Orientação e Assistência Rural (Assesoar), Elisângela Bellandi Loss, participou das oficinas da iniciativa, realizada em parceria com a Articulação Paranaense de Agroecologia (APRA), e considerou esses espaços como importantes para a luta pela aprovação da Lei Estadual de Agroecologia no Paraná. “Precisamos ter políticas públicas com recursos disponíveis e, naquelas oportunidades, discutimos a necessidade da incidência delas também nos planos plurianuais, a fim de garantir a viabilidade e o avanço da pauta da agroecologia”, disse Loss.
“Quando falamos em políticas públicas, não podemos deixar de avaliar que temos campo de ação junto aos municípios também, onde as oportunidades e diálogos podem ser facilitados e o fortalecimento das ações acontecem de forma direta e mais rápida, tornando a implementação delas ainda mais efetiva”, acrescentou a agrônoma da Assesoar. “A iniciativa ‘Políticas Públicas de Agroecologia na Boca do Povo’ precisa ser massificada e abraçada, para que o debate sobre a importância da agroecologia – como proposta não só produtiva, mas de desenvolvimento rural e urbano – seja enraizado nos municípios”, destacou.
Para a agricultora Cleonice Freitas Gurgel, de Francisco Beltrão (PR), integrante da Rede Ecovida e do Núcleo Executivo da APRA, que também participou das atividades, é crucial que seja aprovado no estado um instrumento que contemple tudo o que a agroecologia significa. “A participação nesse processo foi muito importante porque a agroecologia é também entendimento e um processo coletivo de construção sólida, para benefício das comunidades rurais e urbanas”, comentou Gurgel. “Esse debate precisa vir para os municípios, especialmente para efetivar alternativas e viabilizar apoio financeiro, a fim de estimular, ampliar a participação e o interesse das comunidades. Temos pessoas capacitadas, atuantes e estamos no rumo certo”, avaliou.