Por Antonio Bazilio Floriani Neto*
De tempos em tempos, a reforma previdenciária ganha espaço nos debates políticos, econômicos e sociais nos mais variados países. Aqui, no Brasil, a situação não é diferente e ano passado o governo iniciou mais um movimento reformador. Assim sendo, o presente artigo tem o objetivo de esclarecer um pouco mais sobre o procedimento que está em trâmite no Congresso Nacional.
A Constituição de 1988 trouxe o conceito de Seguridade Social, um sistema formado pela Assistência, Saúde, Previdência e que se destina a cobrir os cidadãos aos mais variados riscos sociais: da maternidade, passando pela doença, incapacidade, reclusão, miséria, idade avançada até a morte.
Para que possa atingir esse desiderato, indispensável a existência de recursos, pois a concessão de benefícios, seja no âmbito previdenciário, seja assistencial ou, ainda, o oferecimento de um sistema gratuito, descentralizado e universal, como o SUS, representa custos a serem suportados pelo Estado.
Assim, o assunto é retratado sob o viés econômico. Ocorre que o tema contempla uma outra perspectiva: a social. Fosse a sociedade um conjunto estático de pessoas, pouco haveria que se falar em reformas previdenciárias. No entanto, há um processo natural de transformação das famílias que impacta diretamente nos dados demográficos. A premissa é melhor visualizada com exemplos. Nas décadas de 1970 e 1980 era comum a existência de famílias numerosas, formada pelos pais e diversos filhos. Hoje, a realidade é bastante diferente: casais, quando desejam ter filhos, têm em média até dois. Ademais, há 4 ou 5 décadas, a expectativa de vida do brasileiro era significativamente menor, vivia-se menos e com menos qualidade. Mais recentemente, houve o incremento de sistemas básicos de saúde, saneamento, educação, proporcionando um importante salto na expectativa de vida do brasileiro. Além disso, novas formas de família emergiram, novas concepções de casamento, de união estável e todo esse cenário reflete no sistema previdenciário, que deve se adequar às mudanças.
Consequentemente, desde 1988, passamos por 3 grandes reformas na Previdência Social: a primeira, consubstanciada pela Emenda Constitucional 20/98; a segunda, pela EC 41/2003 e, a terceira, pela EC 47/2005.
Agora, o governo busca promover outra grande reforma com a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287/2016. Em síntese, busca-se a alteração de requisitos para concessão das aposentadorias, a modificação da sua forma de cálculo, bem como objetiva-se modificar as pensões, o LOAS e outros benefícios.
O movimento reformador é objeto de críticas pertinentes: (i) o déficit da Previdência é contestável, como repetidamente vem demonstrando a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (ANFIP), em seus relatórios denominados “Análise da Seguridade Social”1; (ii) a desvinculação de receitas da União (DRU), retira do orçamento da Seguridade Social 30% (trinta por cento) de tudo que é arrecadado; (iii) as mudanças na sociedade não ocorrem repentinamente, ou seja, qualquer alteração nas regras previdenciárias deve ser precedida de um amplo debate na sociedade e não de forma urgente, como tem se presenciado; (iv) muitas modificações legislativas em âmbito previdenciário têm ocorrido por meio de Medias Provisórias, procedimento de iniciativa do Executivo, fazendo com que inexista diálogo na sociedade e que o Poder Legislativo seja um mero coadjuvante.
De qualquer modo, estamos em meio a um processo reformador que, certamente, acarretará em mudanças no cenário assecuratório e, abaixo, listamos as principais propostas contidas na PEC 287/2016, dividindo o tema por benefícios:
a) Pensão por morte: se aprovada a PEC da forma com que foi apresentada, o INSS poderá conceder pensões inferiores a R$937,00 (valor atual do salário mínimo). Em outros termos, a PEC busca retirar o impedimento desse benefício ser inferior ao salário mínimo. Outro aspecto, o cálculo será modificado: a pensão será calculada na proporção de 50% mais 10% por dependente.
b) Aposentadoria especial: busca-se exigir que o trabalhador comprove o efetivo dano à integridade física para se aposentar de forma antecipada. Ou seja, não bastará a informação de que trabalhou exposto a agentes nocivos, mas que estes afetem, efetivamente, sua integridade física, tornando substancialmente mais difícil a sua concessão. Ademais, a PEC visa suprimir a possibilidade de enquadramento por categoria profissional.
c) Aposentadoria por tempo de contribuição: será extinta. Hoje, esse benefício é concedido aos homens, após 35 anos de contribuição e, às mulheres, após 30 anos contribuídos ao INSS. Não existe idade mínima, porém há incidência do fator previdenciário, multiplicador que desestimula aposentadorias precoces.
d) Aposentadoria por idade: de acordo com as regras vigentes, essa modalidade de aposentadoria é concedida para os homens com 65 anos e mulheres com 60 anos, após 15 anos de tempo de contribuição. Com a PEC, busca-se implementar uma idade mínima de 65 anos para ambos os sexos. Além disso, exigir-se-á 25 anos de contribuição. Em relação ao cálculo do benefício, a aposentadoria corresponderá a 51% da média das contribuições, mais 1% a cada ano contribuído. Isso significa que para o cidadão aposentar-se com 100% da média, terá que contribuir por 49 anos. Veja que para alguém se aposentar aos 65 anos de idade com 100% da média, terá que ter iniciado suas contribuições para a Previdência aos 16 anos e não ter falhado um único mês.
e) Aposentadoria dos professores: a PEC busca revogar os critérios diferenciados para os professores do ensino fundamental e médio, que até hoje podem se aposentar após 30 anos de trabalho (homens) e 25 (mulheres).
f) Benefício Assistencial (LOAS): governo quer elevar o critério etário de 65 anos para 70 anos.
Há de se mencionar outros aspectos presentes no texto, a saber: a impossibilidade de acumular pensão por morte com qualquer outra aposentadoria. Pelas regras atuais é plenamente possível o cidadão aposentar-se e, quando seu companheiro(a), cônjuge, falecer, passar a receber a pensão. Contudo, objetiva-se proibir essa acumulação, o que irá afetar a renda familiar da família. Por fim, importante destacar a previsão de uma regra de transição, aplicáveis aos homens com mais de 50 anos e mulheres com mais de 45 anos que não tenham atingido aos requisitos necessários para se aposentar por tempo de contribuição. A PEC estabeleceu um pedágio de 50% do tempo restante. Por exemplo, caso falte ao segurado(a) apenas 2 anos para atingir o tempo exigido, terá que permanecer contribuindo por mais 1 (50% do que faltava), totalizando 3 anos.
Na atual conjuntura, uma mulher com 40 anos de idade e 20 anos de contribuição ou um homem em idêntica situação, serão enquadrados nas novas regras (65 anos de idade e 25 anos de contribuição).
Diante do exposto, conclui-se que a reforma iniciada busca alterar significativamente o cenário previdenciário, tornando muito mais rígidas as regras para os segurados do INSS.
*Antonio Bazilio Floriani Neto é advogado, doutorando em direito e professor universitário.