O escritório Trindade e Arzeno Advogados Associados, a pedido do Senge-PR, analisou as “emendas jabutis” inseridas em diversos projetos legislativos e até em Medidas Provisórias presidenciais. O tema ganhou o noticiário com a tentativa de revogação do Salário Mínimo Profissional e com a tentativa de promover uma minirreforma trabalhista dentro do Novo Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda que é analisada hoje (1), no Senado. Além de explicar a origem do termo “jabuti”, a banca de especialistas ainda mostra porque o método é antidemocrático, pois tenta burlar fases do processo legislativo.
Antes de analisar a inserção de emendas estranhas ao projeto original, os especialistas explicam que o fundamento central do processo legislativo é o princípio democrático, estabelecido no preâmbulo da Constituição Federal – em que se explicita a vontade do constituinte originário em estabelecer um Estado Democrático de Direito, contrapondo-se à ordem autoritária.
Para tanto, se baseiam na definição do filósofo e historiador político, Norberto Bobbio, no texto “O futuro da Democracia”. Diz ele que “o único modo de se chegar a um acordo quando se fala de democracia, entendida como contraposta a todas as formas de governo autocrático, é o de considerá-la caracterizada por um conjunto de regras (primárias ou fundamentais) que estabelecem quem está autorizado a tomar as decisões coletivas e com quais procedimentos”.
E é justamente neste cenário em que o processo legislativo pode ser delineado como a concretização do princípio democrático, é que a prática das emendas “jabutis” já foi enquadrada como sendo contrária aos preceitos fundamentais estabelecidos pela Constituição Federal pelo Supremo Tribunal Federal, e deve ser combatida como sendo uma forma de subversão dos patamares mínimos estabelecidos pela ordem jurídica posta. “Há verdadeira subversão do devido processo legislativo, mediante a supressão do debate das matérias legislativas pelos deputados”, analisa a equipe.
O tema se torna mais preponderante quando se observa que as medidas provisórias são “atalhos” na tramitação de projetos, desde que obedeçam critérios como relevância e urgência. “São instrumentos normativos excepcionais, considerando que somente deveriam ser adotadas em casos de relevância e urgência sociais”.
Ao invés de tramitar perante as Comissões Legislativas específicas da Câmara e do Senado, a medida provisória é analisada por uma comissão mista específica, formada por deputados federais e senadores, que aprova um parecer, podendo conter alterações ao texto originário da MP.
“E é nesta alteração que mora o chamado “jabuti legislativo”. O termo é decorrente de uma frase atribuída ao ex-presidente da Câmara dos Deputados e da Assembleia Constituinte, Ulysses Guimarães, que dizia que ‘jabuti não sobe em árvore’. Se está lá, ou foi enchente ou foi mão de gente”. Ou seja, “uma emenda 1jabuti1 nada mais é do que um ‘contrabando’ realizado pelos parlamentares ao inserirem em uma proposta legislativa um tema que não guarda relação com o texto original”, recupera a análise jurídica.
Essa percepção é referendada pelo entendimento jurisprudencial consolidado pelo STF, embasado na contemporânea doutrina jurídica. Para o Supremo, a prática de emendas “jabutis” quando do processo de conversão em lei de medidas provisórias vai contra os preceitos constitucionais que regulam não apenas o processo legislativo, mas o ordenamento jurídico como um todo.
Jabutis são prejudiciais à sociedade
Recentemente, dois episódios desta prática voltaram a ocorrer, e que impactam diretamente a categoria profissional dos engenheiros: tratam-se das emendas parlamentares realizadas nos processos de conversão em lei das medidas provisórias n° 1040 e 1045.
O primeiro trazia como jabuti a previsão de revogação integral da Lei n° 4.950-A/1966 (que estabelece o piso mínimo profissional dos engenheiros, químicos, arquitetos, agrônomos e veterinários).
Já a Medida Provisória n° 1045/2021, por sua vez, institui o Novo Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, tendo como jabuti um projeto de conversão em lei de medidas adicionais, realizando uma verdadeira “minirreforma trabalhista”. “A proposta aguarda análise pelo Senado Federal, mas certamente será objeto de inúmeras medidas judiciais, especialmente perante o Supremo Tribunal Federal, tendo em vista o entendimento consolidado pela Corte, conforme já exposto”, esclarece o departamento jurídico.
Confira na íntegra a nota técnica “Processo Legislativo Emendas Jabutis e Medidas Provisórias”