Por Manoel Ramires/Senge-PR
“Se você me perguntar, como político eu queria fazer média com o servidor. Agora, como governador, eu tenho que ser responsável, eu não posso fazer isso”. Essa frase pertence ao governador Ratinho Júnior. Ela foi dita um dia antes do início da greve unificada dos servidores, em 25 de junho, e que está sendo suspensa pelos sindicatos desde o último dia 12 de julho, quando o governador oficializou a proposta de pagar 2% em janeiro de 2020.
Ao anunciar o reajuste, Ratinho destacou que o estado contabiliza R$ 700 milhões em inadimplência com IPVA, mas não teceu nenhum comentário sobre a renúncia fiscal de R$ 10,5 bilhões neste ano com relação ao ICMS e de R$ 55 bilhões ao longo de cinco anos. “A verdade é que o governo prefere isentar R$ 10,5 bilhões em impostos a empresários do que investir no servidor que atende a população paranaense. Essa é a verdade! Chega de calote”, afirmou o Fórum das Entidades Sindicais no auge da greve. De acordo com o cálculo dos sindicalistas, com apenas R$ 3 bilhões seria possível pagar os 17% de perdas dos últimos três anos.
Batalha de números
Essa introdução mostra que o governador perdeu a batalha de números e foi obrigado a conceder o mínimo para que a greve se encerrasse. Ele foi pego em contradição por ter dito, no ano passado, antes e durante a eleição, que iria se reunir com os sindicatos em um dos primeiros atos do seu governo para garantir o pagamento da data-base. No entanto, além de não se sentar em mesa de negociação, o governador ainda cancelou reunião com os sindicatos e o FES.
A posição do governador sempre gerou desconfiança nos servidores públicos. Em 15 de abril, a coordenadora do FES, Marlei Fernandes, cobrou compromisso do governador. “Estamos cansados de saber pelas redes sociais a posição do governo que, infelizmente, mantém a mesma postura do antecessor (Beto Richa). A gente quer uma mesa de negociação. Não dá para a gente ir em uma reunião e na semana seguinte o governo expor todos os seus posicionamentos pelas redes sociais. Isso significa desrespeito com os servidores e ao seu direito de ter seus sindicatos para representá-los”, destacou.
Apoio técnico
A cobrança surtiu efeito. De acordo com o FES, foram realizadas oito reuniões entre técnicos e lideranças dos sindicatos para debater a pauta de reivindicações. Além disso, na Assembleia Legislativa do Paraná foi realizada uma audiência pública para discutir os números apresentados pelo governo. Foi formada a Bancada do Serviço Público e as lideranças do movimento tiveram diversas reuniões com os parlamentares.
Em um desses últimos encontros, ainda antes da nova proposta do governador e após o encerramento das sessões plenárias, o presidente da Alep, Ademar Traiano, disse que os deputados estavam comprometidos em garantir a data-base. “O trabalho da Assembleia e dos deputados é fundamental para tentarmos resolver esse impasse e encontrarmos uma solução para que a greve acabe e todas as partes fiquem satisfeitas”, declarou.
O compromisso era efeito da ocupação das galerias da Alep em 9 de julho, quando o governo não apresentava proposta diferente daquela de reajuste de 0.5% em outubro e o parcelamento de 5,08% em cinco anos. Nesse dia, um documento entregue aos deputados pressionava:
“Os estudos feitos pelo FES e que foram amplamente debatidos com o governo demonstram as condições para o reajuste integral da inflação ainda no exercício de 2019. A posição da SEFA contamina o governo e impede o avanço para percentuais de recomposição salariais mais dignos”, registra a carta.
A força da mobilização
A pressão dos servidores, aliás, foi a grande mola que fez o governador Ratinho Júnior deixar de falar de congelamento de vencimentos pelo quarto ano consecutivo e melhorar a proposta de 0,25%. Nos últimos quatro meses, pelo menos quatro grandes atos mostraram a unidade e força do funcionalismo público. No primeiro deles, em 29 de abril, cerca de 10 mil pessoas ocuparam as ruas da capital em defesa da data-base.
Posteriormente, em 14 de junho, data da greve geral contra a previdência, com milhares de pessoas nas ruas, os servidores estaduais anunciaram que entrariam em greve a partir do dia 25 de junho. “Na próxima terça (18 de junho) tem uma reunião da bancada dos deputados com o governador. É de bom tom que o governador faça uma proposta antes do início da greve”, alertava Marlei Fernandes, do FES.
Dois atos unificados, nos dias 2 de julho e 9 de julho, fortaleceram o movimento que agora está conquistando o reajuste do funcionalismo. Manifestações essas que ganharam corpo com protestos de agentes de segurança pública, greve das universidades e pequenos ações ao longo dos 17 dias de greve. Em um deles, servidores da segurança fizeram carreata como aquecimento para II ato unificado.
“A maioria compreendeu que a greve foi um movimento vitorioso pela organização da categoria e a unidade dos servidores”, avaliou Hermes Leão, presidente da APP Sindicato, ao suspender a paralisação de professores e funcionários de escola.
Alerta
Por outro lado, o funcionalismo deve seguir em alerta. O governo do estado ainda deve encaminhar o projeto de lei à Assembleia Legislativa. Em documento entregue ao FES, Ratinho Júnior propôs o pagamento da reposição salarial de 2% a partir de janeiro de 2020, 1,5% em janeiro 2021 e 1,5% em janeiro 2022, além da retirada do Projeto de Lei Complementar n° 4/2019, em tramitação na ALEP, que prevê o congelamento dos salários e das promoções dos servidores estaduais por 20 anos. A Casa está em recesso até 1o de agosto e as sessões retornam no dia 5 de agosto.
O FES
O Fórum das Entidades Sindicais é formado por 22 entidades sindicais unidas para negociar com o governo e reivindicar, em conjunto, os direitos dos servidores. Entre eles, o Senge-PR. A vaga no FES é ocupada pelo presidente Carlos Bittencourt, que participou de diversas reuniões do comando de greve e de toda a mobilização deste ano. O Fórum representa mais de 200 mil servidores públicos do Paraná.